quinta-feira, 24 de dezembro de 2020

O Céu... e O Mundo São Azuis

Altar da Paz é uma das mais lindas obras da artista plástica Rachel Roscoe, pintura pela qual ela mesma tem um carinho especial. Assim ela escreveu sobre a obra: “Devido à sua grande dimensão, 235 x 145, ao nos aproximarmos da mesma podemos nos sentir praticamente dentro dela. Sempre faço o exercício de me projetar na arvorezinha branca que caminha em meio à vastidão azul. Sinto uma paz acolhedora e daí o título.”

Outro dia conversei com a pintora sobre algumas de suas telas. Na noite seguinte à nossa conversa, tive um sonho no qual ela me mostrava alguns de seus quadros. E se deteve especialmente no Altar da Paz.

Claro que não compreendemos tudo do mundo dos sonhos. Mas, como antes havia pedido sua autorização para deixar uma foto desta obra na tela do meu computador, isso pode ter me inspirado durante a noite.

Sempre que a imagem entra na tela, sinto realmente uma paz muito grande, logo de manhã cedo. E cada vez que a vejo, ao ‘abaixar’ os programas abertos e o navegador, uma energia muito positiva chega até mim, sem filtro.

E há sempre momentos que busco ver a imagem desta pintura (que, é claro, não substitui a experiência de ver a obra original) só pra admirá-la e meditar. 

Não gostaria aqui de falar sobre detalhes técnicos ou tentar explicar a obra ou algo parecido.

A magia dela deve ser preservada, a ligação com o mundo dos sonhos da artista. A forma como ela visita este universo encantado certamente lhe inspira de forma diferente. Percebo como ela dá vida aos seus sonhos em suas pinturas.

O poeta Ferreira Gullar assim disse, em entrevista ao diretor Zelito Viana: “O pessoal diz que a arte revela a vida. É mentira. A arte não revela a vida. A arte inventa a vida! A noite estrelada de Van Gogh só existe na tela dele. Ele não está revelando (nada). A noite que existe no cosmo é outra coisa. Ele criou uma noite que só existe na tela dele. Então ele acrescentou, aos bilhões de noites, uma que só existe ali!”

Rachel acrescenta, para nós, lindas imagens, que só existem no seu mundo de sonhos. Ela disse, em uma recente Live, sobre o Altar da Paz: “Ele retrata muito essa questão da paz interior. Para mim, é o céu. Se eu pudesse retratar o céu, seria isso. Ele todo em tons de azul.”

Sobre os tons, sei que ela tem acesso irrestrito ao mundo das cores, muitas das vezes das suas próprias cores.

O azul pode estar associado a vários estados e sensações. Mas, no Altar da Paz, fica marcante, para mim, a tranquilidade e a harmonia.

O equilíbrio entre as tonalidades, ao fazer uma analogia com a música, é como se ‘escutássemos’ várias melodias interdependentes, um contraponto, muito além de acordes, que são notas tocadas ao mesmo tempo ou em uma sequência perceptível.

O cosmonauta soviético Yuri Gagarin, em abril de 1961, tornou-se o primeiro homem a chegar ao espaço sideral, consagrando a frase: “A Terra é azul. Como é maravilhosa, incrível!”

Ao me lembrar dessa frase, eu me recordei de uma linda música da banda inglesa Moody Blues, Blue World, Mundo Azul. Assim é o refrão, no original (inglês) e traduzido para o português:
It’s a Blue World (É um mundo azul)
It Takes Somebody to Help Somebody (É preciso alguém para ajudar alguém)
It’s a Blue World (É um mundo azul)
It’s a New World (É um Mundo Novo)
It Needs Somebody to Love Somebody (É preciso alguém para amar alguém)
It’ s a Blue World (É um mundo azul)
(No final, um vídeo da música)

Devemos agradecer por estarmos no mesmo mundo com uma artista tão talentosa, criativa e original.

Muito obrigado, Rachel, por nos permitir conhecer um pouco de seus maravilhosos sonhos!

Neles, O Céu é Azul. E o Mundo também pode ser!


 



domingo, 13 de dezembro de 2020

Magos, Gurus, Mitos, Semideuses & Justiceiros

  

“Ervas daninhas arruinam campos

Ignorância arruína a humanidade
Presentes concedidos a quem está livre da ignorância
Traz grandes recompensas”
(O Damapada, Capítulo 24, verso 25)

Eu não gostaria de escrever sobre os Magos, Gurus, Mitos, Semideuses e Justiceiros de nossos dias, para não ativar sentimentos enervados. Porém, eles serão fáceis de ser identificados durante a leitura.

Gostaria sim de lembrar figuras de nossa história, algumas mais recentes e outras de outrora, que convenceram centenas, milhares e, por vezes, milhões de pessoas a cegamente seguirem suas maluquices e muito danosas ações.

O Rei James IV da Escócia trouxe o melhor da Renascença europeia para aquele país. Artistas, poetas, músicos, cientistas, diplomatas, dentre outros. John Damian era seu alquimista pessoal. Suas experiências públicas eram sempre apoiadas pelo seu ‘padrinho’.

A mais famosa foi sua tentativa de voo partindo das muralhas do Castelo de Stirling. Em setembro de 1507, Damian anunciou para a corte de James IV que voaria daquele Castelo até a França. Ele fez asas com penas e saltou...

Aleister Crowley, fruto de uma rica família britânica, nasceu em 1875 e faleceu em 1947. Era habilidoso em várias áreas, mas foi com a prática da magia negra que colecionou muitos seguidores e admiradores, dentre eles músicos e escritores famosos. Ian Fleming, o criador de James Bond, propôs que Crowley se infiltrasse em agências nazistas interessadas pelo ocultismo. E possivelmente o ‘V’ de Vitória de Churchill foi aconselhado por ele. Na prática, não passou de um charlatão, um playboy metido a bruxo que viveu à custa de quem acreditava nas suas bobagens. De bom mesmo foi só ter inspirado Ozzy Osbourne, Randy Rhoads e Bob Daisley a compor Mr. Crowley, uma das melhores músicas da carreira solo do ex-Sabbath.

Um dos gurus mais famosos do século XX foi o americano Jim Jones, líder do culto 'Templo dos Povos'. Começou suas atividades pseudo religiosas em Indiana, EUA. Curiosamente, visitou, nos anos 60, minha cidade natal, Belo Horizonte, e a colocou numa lista dos locais mais seguros caso houvesse uma guerra nuclear. Em 1965, mudou-se para a Califórnia, onde o fanatismo por ele cresceu de vez e, nos anos 70, foi para a selva da Guiana, no norte da América do Sul, com seus seguidores. O congressista americano Leo Ryan liderou uma delegação para investigar abusos de direitos humanos por parte de Jones. Em 1978, Ryan e outras 4 pessoas foram assassinadas por tiros em Georgetown, capital guianense, após deixar o local da comunidade. Ampliando em escala a tragédia, Jim, em seguida, ordenou então o suicídio / assassinato em massa de 918 dos seus membros em Jonestown, Guiana, muitos deles envenenados por cianeto. O maluco então suicidou com um tiro na cabeça.

Quando penso nos mitos de nossa história que fizeram e falaram muita besteira, eu me recordo, é claro, do argentino Ernesto “Che” Guevara. Uma foto marcante de Che, tirada pelo cubano Alberto Korda, em 1960, mostra o então guerrilheiro com traços fortes, dando a impressão de um homem com cara de homem. A foto vem rodando o mundo desde então, estampando camisas e bandeiras e ilustrando muitas capas de livros.

Guevara foi um aventureiro desorientado e um assassino profissional, mas também tinha outro lado, era médico e idealista. E, como as personalidades que hoje são consideradas mitos não passam de entidades com sérios problemas mentais, ignorantes em todos os assuntos e completamente abobalhadas, para ‘homenageá-las’ só posso me recordar da figura da Mula Sem Cabeça. Personagem do folclore brasileiro, a mula, que tem fogo no lugar da cabeça, galopa através dos campos desde o por do sol de quinta-feira até o nascer do sol de sexta-feira. Ou seja, algo sem sentido, sem pé, nem... cabeça.

A maior divindade criada no século XX foi, sem dúvida alguma, o líder cubano Fidel Castro. Mas, sua figura é tão complexa que um parágrafo seria pouco para falar do fanatismo internacional em relação a ele e da ditadura militar que criou.

Como o argentino Juan Domingo Perón é também um ótimo exemplo para falar sobre divindades, eu prefiro escrever um pouco sobre ele. Tirando Evita, musical e filme de sucesso, baseado na vida da primeira esposa de Perón, Eva, a Evita (‘Don’t cry for me Argentina...’, lembram?), o alcance de Juan como Deus não ultrapassou os limites da terra de Jorge Luis Borges, mas teve (e tem) um efeito semelhante à radioatividade na população daquele país. A briga maior entre os hermanos é para saber se ele foi um político de direita ou de esquerda. No final das contas, ele foi um populistas da pior espécie. Além das suas trapalhadas e excentricidades pessoais e namoro com o fascismo, conseguiu a façanha de quebrar financeiramente a Argentina. O país tinha uma economia sólida e um alto nível cultural antes de Perón. Ele fez tantas besteiras e desatinos em seus mandatos que até hoje os argentinos tentam, sem sucesso, se recuperar. Mas Perón continua Deus. Sim, com ‘D’ maiúsculo.

Para escrever sobre os justiceiros perigosos e danosos, pensei inicialmente no inglês Matthew Hopkins, um cruel caçador de bruxas do século XVII, que atuou durante a Guerra Civil Inglesa.

Mas, como queria fazer um paralelo com personalidades oficiais da época atual, eu me lembrei de Tomás de Torquemada, inquisidor-geral dos reinos de Castela e Aragão no século XV e confessor da rainha Isabel, a Católica. É conhecido por sua campanha contra os judeus e muçulmanos convertidos. Provavelmente o número de execuções durante o mandato de Torquemada foi de 2.200 pessoas. O chefe do ‘Escritório de Perseguições e Mortes Injustas’ da Igreja Católica naqueles reinos, segundo diria meu pai, depois que morreu certamente “caiu igual a uma pedra no inferno”. E o diabo ficou com medo dele. 

Mas o que ocorreu com John Damian, o que tentou voar da Escócia até a França?
É claro que não voou nem um metro. Caiu no que os escoceses chamam de midden, tendo assim, felizmente para ele, uma queda suave. E sobreviveu.
Mas o que significa midden? 
Quer dizer um depósito de lixo. No caso, este recebia todos os detritos provenientes do castelo de Stirling.
O grande problema é esse. O charlatanismo, os desatinos e as ações perigosas dos magos, gurus, mitos, semideuses e justiceiros, que vez ou outra surgem, são cegamente apoiados por uma massa de pessoas ignorantes. E este lixo é muito difícil de reciclar.

 

 

domingo, 20 de setembro de 2020

A Luz Dos Seus Sonhos

Sempre digo que assisti a grandes shows e concertos Aproveitei muito bem as oportunidades que surgiram, assistindo a bandas clássicas e excelentes intérpretes em sua melhor forma.

Quando esses shows ocorriam em minha cidade, eu raramente perdia as apresentações. Mas perdi shows de três músicos que admiro.

Paco de Lucía e B.B. King se apresentaram duas vezes em Belo Horizonte. Perdi as duas apresentações. E os dois já se foram.

E outro grande músico também se apresentou em minha terra natal e não fui ao seu show. Eric Clapton, um ícone de várias gerações, com sucessos que vão do Blues ao Pop. Passando, é claro, pelo Rock.

Sempre um pensamento vinha à minha mente: ‘Perdi o show do Eric Clapton’. Mas, por que ‘vinha’ e não ‘vem’? Porque um dia para mim foi contada uma linda história que aqui vou reproduzir.

Once upon a time, ou melhor, Era uma vez uma linda moça que, quando tinha 14 anos, foi ao show de Eric Clapton em Belo Horizonte, em 11 outubro de 1990, no Ginásio do Mineirinho

Eu já via seus olhos através de meu espelho. Mas um dia ela me surgiu em um sonho. Atravessou o cristal e sentou-se ao meu lado.

Conversamos sobre arte e música. Curiosa estava sobre as muitas histórias que eu lhe contava sobre os shows que eu tinha visto. Mas, quando lhe disse sobre os que eu tinha perdido, ela me contou que havia visto o do guitarrista e cantor inglês. Eu, então, pedi que aquela, agora uma linda mulher, me contasse da sua experiência.

Ela ficou preocupada em me dizer sobre as músicas do show, durante todo seu relato, mas se não lembrava tanto do nome delas. Eu sempre dizia que isso não era o mais importante.  Na verdade, eu queria saber das suas sensações.

Como foi o primeiro show de verdade de sua vida, ela me disse que lembrava até da roupa que usava naquele dia. E que, mesmo da arquibancada, foi muito emocionante estar ali.

Comentou sobre o som estar bom, mesmo que o local fosse famoso pelo som normalmente ruim. Mas eu lembrei que uma vez eu havia lido algo como: “Os engenheiros de som do Eric fizeram milagres e embora o som tivesse problemas, foi bem audível e o melhor que assisti no Mineirinho.”

Continuando seu relato, em um momento, a minha visitante deu a risada mais gostosa do mundo. E, novamente disse – ‘tá vendo! não vou poder falar nada da música’ – disse então que se lembrava dos pingentes luminosos com líquido fluorescente que eram vendidos:

‘Aquilo eu nunca me esqueci, me chamou atenção, porque aquilo é a luz dos meus sonhos!’

Ela também se lembrou dos isqueiros que foram acessos durante uma música em especial.

Então, cantarolei um trecho de Wonderful Tonight.

And then she asks me, Do I look all right?
And I say, "Yes, you look wonderful tonight
(E então ela me pergunta, eu estou bem?
E eu digo: "Sim, você está maravilhosa esta noite)

E ela me disse: ‘Que bom que você trouxe essa lembrança pra mim! Dá pra imaginar eu dançando ali com você!’

Nesse momento, para mim, foi como se eu tivesse ido àquele show. Eu não perdi o show de Eric em Belo Horizonte, pois a moça do espelho conseguiu me transportar para lá. Isso só é possível para quem tem o poder da magia.

E chegou o momento dela voltar. E me perguntou:
‘Depois que eu voltar, para onde você vai?’
Eu lhe disse: ‘Eu voltarei para Avalon nesses dias, para proteger meu coração’.
‘E você lá ficará para sempre?’, ela me perguntou?
‘Meu bote retornará para a margem da qual sairei. Você poderá usá-lo se assim quiser. E, se vier me resgatar, que não seja como em um sonho, mas porque você quer de verdade!”

‘E se eu não for?’, ela me perguntou.

E eu lhe respondi: ‘Caso isso não ocorra, eu terei que me dirigir às praias da Normandia, desembarcar nelas, sobre forte fogo cruzado, e resgatar meu coração. Para mim, não haverá outra forma’.

Triste, ela me disse que temia ‘andar pela escuridão’.

Eu a tranquilizei, dizendo que isso não ocorreria, pois, independente de qualquer coisa, eu sempre estaria ali para lhe apoiar, pois somos as duas faces do mesmo espelho. Eu a cativei e ela a mim. Somos responsáveis um pelo outro, pelos séculos dos séculos.

Antes que aquela linda mulher, aparentando um pouco mais de 40 anos, retornasse pelo espelho de cristal, eu olhei pela imagem que ali estava, através deste. E consegui ver a linda jovem que vivenciou aquele momento, em 1990.

Nós, que temos vida interior, continuamos sendo as crianças, adolescentes, jovens adultas e adultos e todas as outras fases que assim surgirem.

E eu lhe disse: ‘Você está maravilhosa esta noite... como estava naquela também.

segunda-feira, 27 de julho de 2020

O Cavalheiro, O Príncipe Dragão, A Cientista e A Garota de Ouro


Sexta-feira, 17 de Julho passado. Indo em direção à minha casa eu sinto um problema mecânico ou elétrico no meu irmãozinho, o carro que tem me ajudado, um corajoso e destemido Fusca.

Consigo levá-lo até a uma oficina próxima, não muito distante do Museu de História Natural. Os proprietários, amigos meus, são especialistas em carburadores. Pedi para fazer a limpeza da peça, imaginando que o problema seria aquele. Eu poderia aguardar durante cerca de duas horas dentro da oficina. Mas, armado com minha máscara, pois estamos em uma pandemia de um vírus muito contagioso, resolvi, na verdade, caminhar pelas ruas e ruelas da região e absorver um pouco de vitamina D com a energia que o sol nos presenteava.

Caminhando e meditando, observei várias pessoas que, seja pelo desleixo, negacionismo ou ignorância, estavam sem máscaras ou com elas abaixo do nariz ou do queixo. É curioso e intrigante como isso ocorre com muita frequência aqui no Brasil. E me lembrei de quatro países de culturas distintas, localizados em continentes diferentes do planeta, que são Uruguai, Vietnã, Nova Zelândia e Alemanha, que têm combatido o coronavírus de forma muito eficaz. Porque seria? Será que teria relação com o respeito entre as pessoas em suas culturas?

No retorno à oficina ainda passo pelo estádio Independência, do América. Gosto desse clube, que era o do coração do meu pai. Não acompanho tanto futebol nos últimos anos, mas não pude me esquecer de um amigo, Eduardo, cuja família é americana. Tiro uma foto para enviar-lhe. Mas não remeti no mesmo dia, pois recebi a triste notícia do falecimento de sua mãe. No antigo estádio Independência, meu pai assistiu à histórica partida em que a inexpressiva seleção dos Estados Unidos derrotou a da Inglaterra por 1 x 0, pela Copa do Mundo de 1950.

Roque Máspoli foi goleiro da seleção uruguaia. No final dessa mesma Copa, ele foi um dos responsáveis pela trágica derrota brasileira, em pleno Maracanã mais cheio impossível, em uma partida que já está virando lenda. Durante minha vida eu vi várias fotos de Máspoli abraçando, de forma muito cavalheira, os jogadores brasileiros em prantos. Ele certamente comemorou a vitória de sua seleção. Mas, não se esqueceu dos adversários. Uma vez eu li que ele foi de jogador em jogador brasileiro, levando seu carinho.

Ao chegar à oficina e testar o carro, notei que o problema não havia sido corrigido. Um dos donos desta, sempre muito gentil, ofereceu tentar encontrar a solução. Mas, para isso, o garoto teria que ficar lá até o princípio da semana seguinte.

Volto a pé para minha casa. Já havia caminhado muito nas horas anteriores e tive que encarar mais uns quilômetros. Sou um andarilho, mas nessa pandemia com certeza reduzi o ritmo, pois não estamos de férias. Não é responsável estar toda hora na rua. E o caminho foi longo. Ao chegar em uma avenida que une Belo Horizonte à divisa com Sabará, recebo um conforto visual. Ela é arborizada. E me lembrei da meditação caminhando que me remete a um gentil mestre budista, que muito me ensinou e ajudou, Thich Nhat Hahn, autor de vários livros, um deles chamado O Príncipe Dragão, sobre estórias e lendas do Vietnã. Para falar um pouco dele gostaria de utilizar um trecho do prefácio da tradução em português de outro livro de sua autoria, ‘Para Viver Em Paz – O Milagre da Mente Alerta’. A atriz brasileira Odette Lara realizou a tradução e escreveu o prefácio. Como segue.

“No dia anterior à partida de Thich Nhat Hanh foi programado para sua despedida um piquenique no alto de uma montanha. Thich Nhat Hanh foi convidado a caminhar à frente e, sendo a trilha muito estreita, tínhamos que caminhar de forma indiana. Tão lentos eram seus passos que uma certa inquietação e impaciência se instalou em cada um nós. Mas como, por cortesia, não poderíamos mudar a situação, algo interessante começou a acontecer. Aquele ritmo fazia nossa atenção se voltar para os detalhes da vegetação por que passávamos, para as múltiplas formas das árvores, folhagens e flores, para suas infinitas variações de cores. Na verdade eu estava, e creio que todos os demais também, pela primeira vez, apreciando em totalidade a beleza daquela trilha, forma natural de ver de Thich Nhat Hanh.”

No meio do caminho, observando as árvores, folhagens e flores e suas cores, eu me lembrei de algo que uma pessoa muito querida me havia enviado. Era uma música de cerca de cinco minutos. Ela me disse que amava os dois primeiros minutos. Mas, logo que uma voz gutural começava, ela tinha que desligar a música. Tinha razão. A música ia bem até aquele ponto; depois, desandava. Eu pensei. Será que dá pra fazer uma magicazinha, editar a música e criar um áudio só para ela?

A contagiante energia positiva dessa pessoa me lembra a jovem Jacinda Ardern, a atual primeira ministra da Nova Zelândia. Muito dinâmica e alegre, demonstra enorme inteligência e competência para resolver os problemas de seu país, tratando a pandemia com muita seriedade, para citar apenas um exemplo. Meses atrás eu brinquei com uma amiga, ao falar de Jacinda: ‘Eu me casaria com essa moça! Pena que está distante e já é casada!’. Irritada e com o ego inchado, essa minha amiga me perguntou: ‘Por que não comigo?’. Eu só sorri. Qualquer coisa que falasse só pioraria o assunto.

Durante a semana seguinte, os donos da oficina tentaram de diversas formas solucionar o problema, mas sem sucesso. Na quarta-feira volto ao local. No caminho, a pé, muitos pensamentos e insights vêm à minha mente. Vou guardá-los para outras crônicas, pois esta já será um pouco longa. Chegando ao destino, a mim foi relatado que uma peça fora substituída. Mas, ao ligar o veículo, percebi que ele não estava bem. Desde que venho conduzindo esse carrinho, ou o contrário, sinto o coração dele ao apertar o acelerador. É necessário escutar um certo som, que meu pai me ensinou qual era quando eu tinha uns sete, oito anos. Esse ‘som’ já não estava presente há alguns meses.

Consigo, com muita dificuldade, levar o carro de volta para minha casa. No dia seguinte, peço a um amigo, Gilmar, que tem uma oficina perto de minha casa, para me ajudar. Eu estava verdadeiramente triste com o estado do mocinho, pois algo me liga a ele, como eletromagnetismo. Se ele não está bem, eu também sofro e vice-versa. Com muito cuidado, perícia, atenção e também coração, no sábado, com a porta fechada de sua oficina, Gilmar cria uma peça de duas que existiam (da que fora substituída e da que fora colocada) e devolve a saúde ao garoto.

Eu estava trocando algumas mensagens com a moça da música que eu comentei acima quando recebo uma ligação do Gilmar para buscar o veículo. Peço licença, me dirijo à oficina. Lá, eu ligo o carro, sinto e escuto aquele mesmo barulho da infância. E me recordo de Angela Merkel, Chanceler da Alemanha, chamada de ‘Líder do Mundo Livre’, formada em Física, sempre precisa e equilibrada em suas decisões e que vem tendo atitudes sérias e corajosas ao longo dos anos, inclusive durante essa pandemia. Não é qualquer um que tem a capacidade e a precisão para realizar tal conserto naquele veículo alemão, projetado para resistir e ser amigo de quem é amigo dele.

Sendo de gerações próximas e, com a oficina vazia, tive o prazer de, pela primeira vez em muito tempo, conversar com Gilmar por cerca de duas horas, que passaram sem que tivéssemos percebido, trocando experiências e falando de sua netinha, Antonella, nascida em 23 de julho, dois dias antes. Despeço e volto para minha casa, com muita alegria, tanto pelo bom estado do meu irmãozinho, quanto pela ótima conversa que tivemos.

E o áudio que eu queria editar?

Fiz no mesmo dia que voltei a pé para casa, deixando o carro na primeira oficina. Sempre me lembro que, para algumas produções, o conhecimento de orquestração ajuda muito, pois tenho que encontrar pontos corretos na música onde realizar os cortes, como fazer os ‘encontros’ e demais detalhes. Quando se faz com um ouvido não treinado sai algo Frankenstein. Mas é preciso colocar o coração ali também, senão fica tudo muito técnico e frio.

E envio para a moça. Ela me escreve, com letras grandes: "Não acreditei!" E complementa com algo como: ‘Deveria ter sido filmada a cena com minha reação!’. Ela me disse que era uma coisa que ela queria muito que tivesse sido feita.

Naquele dia fiquei muito feliz, apesar de preocupado com o carro que ficara internado. Com a reação e as palavras dela, eu me senti, mesmo guardadas as devidas proporções, cavalheiro e carinhoso como Máspoli, gentil e observador como Thich Nhat Hanh e preciso como Angela Merkel.

E como estava a misteriosa e linda (em todos os sentidos) moça a quem dei o singelo presente?

Não seria necessário filmar! Fisicamente distante... como Jacinda Ardener. Mas, muito mais alegre e viva, iluminando meu ser ao me transmitir, de onde estava, uma incrível luz em toda sua plenitude!

quarta-feira, 15 de julho de 2020

O Mais Doce Som Do Cello


O Poeta Ferreira Gullar sempre dizia que ‘O Poema nasce do espanto’.
Quem me conhece pessoalmente de verdade sabe que todos os seres inanimados podem tomar vida ao entrar em contato com meu corpo. É garrafa com água que sai voando, gira no ar por todo o palco e cai do outro lado. É maçã que sai fora do controle  e, quando consigo pegar, no ar, e segurá-la fortemente junto ao corpo, trinca uma costela, e por aí vai.

Eu me esforço e controlo muito isso, até conversando com esses seres quando estou com mais pressa: ‘fiquem aí, por favor!’

Com celular eu tenho que tomar todo o cuidado do mundo. Mas, outro dia, a escorregada de um dedo, causada pela deslizada do celular, fez com que eu tivesse uma surpresa muito agradável ao, acidentalmente, fazer uma ligação para uma linda moça com a qual estava trocando algumas mensagens sobre arte, música e cãezinhos, as ‘figurinhas’.

Quando estava me recuperando da trapalhada, após dizer alô, me desculpar e perguntar como ela estava (como se eu não tivesse perguntado antes), compensando minha leve timidez com uma boa autoestima, eu levo outro lindo golpe! Escuto uma encantadora voz, um pouco mais grave, suave e tranquila. Apesar de ter sido apresentado a ela uma vez, foi em um local com muito barulho e só trocamos palavras como ‘prazer, tudo bem?’. Ela estava de saída.

Bem, escutar aquela voz foi uma agradável surpresa. Subi no bote salva-vidas para não gaguejar. Acho que não gaguejei. Só acho.

Recuperando-me, logo perguntei se não teria problema conversar um pouco com ela. Nunca sei quando posso ligar para uma pessoa, pois eu também tenho meus compromissos e ocupações durante o dia. Há momentos que fica difícil atender uma ligação. Quando vou para as áreas verdes da casa eu nem levo o celular. Ela gentilmente me disse que estava tudo bem e conversamos por curtos 15 minutos que, para mim, duraram somente uns 3 minutos. Certa vez eu vi uma explicação do Einstein sobre relatividade. Adaptando parte do que ele falou, é algo como ‘o tempo passa rápido quando estamos com alguém com quem queremos estar’. 

Mas, eu me apaixonaria por uma voz? Não, creio que não. A paixão é perigosa. Segundo meu amigo Pedro, a ‘paixão é autoritária, egoísta’, temos que ter muito cuidado com ela. Há outro amigo que certa vez se apaixonou pela voz de uma cantora. Eles se casaram. Após alguns anos eles mal se falavam.  Eu prefiro me envolver e escutar o que a voz que me encanta tem a dizer.

Essa linda voz que escutei é de uma pessoa profunda e verdadeira. Intensa também, mas só para os que têm o privilégio de conhecê-la melhor. Começo a entender que uma pessoa é profunda quando ela, por exemplo, encontra uma antiga caixa de pincéis e tintas e fica feliz como uma criança. Também quando seus quadros têm cores tão lindas que parecem sempre ser pintados por uma jovem talentosa e criativa. Ou mesmo quando lê um longo texto escrito por mim e envia um pacientemente aguardado comentário, como uma mulher que já tem muita experiência. Sem que eu me esqueça de que um dia descubro que ela tem a sensibilidade de escutar Dave Brubeck, dentre tantas outras coisas que, se eu escrever, ficaria aqui lembrando e lembrando.

Sempre faço algumas analogias com a música. O registro médio do som do cello (violoncelo) é muito suave e denso. Não vou comentar aspectos técnicos da música e do instrumento, pois hoje prefiro contar com meu espírito de cigano. Um professor de francês certa vez me mostrou um poema que ele escrevera sobre o cello, algo como se uma pessoa tivesse que abraçá-lo para poder tocá-lo.

Canção dos cisnes (Schwanengesang) é uma coleção de músicas escritas por Franz Schubert no final de sua vida e publicada postumamente. Uma das peças mais lindas dessa coleção é a Serenata (Ständchen), que é normalmente cantada. Mas ficou também conhecida por duo de piano e cello. A princípio pode parecer triste, mas não é. É uma música romântica.

Quando lembro dessa peça, popularmente chamada de Serenata de Schubert, uma linda história vem à minha mente. Ela foi contada pelo meu pai, que tinha muita sensibilidade musical. Um dia ele passava na porta de uma oficina mecânica e escutou essa música sendo executada em violoncelo. Ao entrar e ir ao encontro do som, ele viu um mecânico sentado em frente a um por demais improvisado instrumento, algo como um cabo de madeira enfiado em uma lata de óleo; nele percorria uma única corda de cello, presa em cima, onde era afinada. Segundo meu pai, o mecânico tocava lindamente a Serenata, o que o fez se emocionar.

Não vou dar um link de uma interpretação dessa peça. Ele vai ser enviado somente para a moça da voz, me desculpe. Procure no Youtube por ‘Franz Schubert - Ständchen (Serenade)’.

Por que escrevo esse texto, me abrindo tanto assim? Porque é necessário. Não sou poeta, como Ferreira Gullar era, mas preciso escrever sobre o que me encanta. O faço com muito respeito pela linda mulher que possui a voz tão charmosa. Ela sabe disso. Eu deixo de lado a leve timidez e escrevo.

Dizem que isso representa uma fraqueza etc. Eu não me preocupo. Homens têm medo de mulheres inteligentes e talentosas. Eu não. Fico absolutamente encantado com qualidades que podem me tornar mais feliz e estas devem ser enaltecidas.

E o que ela poderia pensar sobre isso? Não sei, eu não tenho e nem gostaria de ter o poder de controlar o sentimento das pessoas. Eu estou aqui no meu mundo mágico, que é o dela também, pois nosso coração é cheio de alma.

Pergunte ao vento. Se você me vir conversando com ele, vai entender o que é conseguir viajar entre o mundo dos sonhos e o das coisas-como-elas-realmente-são.



quarta-feira, 1 de julho de 2020

Travelling in Time...

Prezadas amigas e prezados amigos,
Em redes sociais, entre textos publiquei algumas imagens.
Chegando à 10ª., as inseri em uma única publicação aqui no Blog.
A última e que insiro como a principal é a pintura de nome Flamboyants, da artista Rachel Roscoe.
Vale a pena viajar!

10) Flamboyants (Rachel Roscoe)
Raros são as e os artistas que combinam talento, criatividade e originalidade em suas obras.
Reconhecemos os três dons e muitos outros quando estamos diante das telas de Rachel Roscoe.
Mas, na verdade, eu lhe convido, seja no seu celular, tablet ou notebook, a abrir a foto. Dê a você mesmo (a) um tempo e contemple com calma essa bela pintura. Tente respirar cada vez mais lentamente. As lindas cores e os níveis de profundidade vão lhe ajudar a serenar a alma e encontrar muita paz interior.
Agradeço à Rachel por sempre nos presentear com sua arte! 


Flamboyants (2015, Acrílica sobre tela, 120 x 180)
Copyright (Todos direitos preservados)
Referências:

https://www.facebook.com/roscoerachel/

https://www.instagram.com/rachelroscoe_arte/

01) Somewhere In Time...


02) Galáxia em Espiral


03) Santuário Fushimi Inari, Quioto, Japão




04) Via Férrea Através da Floresta 1


05) Via Férrea Através da Floresta 2


06) Vortex Tunnel


07) Poço Iniciático, Quinta da Regaleira, Sintra, Portugal.




08) Now-Time
O único momento que existe é o Agora!
O Passado, claro, nos ajuda a não cometer os mesmos erros. Devemos aprender com ele.
O Futuro, no entanto, depende 100% das decisões e atitudes que tomamos Hoje!


09) Ilha de Chios, na Grécia.


Bônus:
A Distância Que Nos Unirá Novamente! (Publicado em 29 de março de 2020)
A necessária distância social que rege o mundo atualmente é muito bem representada pela arte abaixo.
Se nos afastarmos agora, a maioria de nós voltará a se unir. Caso contrário, poderemos sentir falta de pessoas importantes para nós.
As formações clássicas de Deep Purple e Kiss, que gravaram os álbuns In Rock e Destroyer, respectivamente, se uniram e se afastaram algumas vezes.
E mesmo com discórdias e uma perda (Jon Lord) entre eles, com o tempo pelo menos o contato sempre se refez.
Que tenhamos bom senso, cuidemos dos mais desprovidos de recursos e caminhemos para que nossa sociedade seja mais justa e menos egoísta.