“Ervas daninhas arruinam campos
Presentes concedidos a quem está livre da ignorância
Traz grandes recompensas”
(O Damapada, Capítulo 24, verso 25)
Eu não gostaria de escrever sobre os Magos, Gurus, Mitos, Semideuses e Justiceiros de nossos dias, para não ativar sentimentos enervados. Porém, eles serão fáceis de ser identificados durante a leitura.
Gostaria sim de lembrar figuras de nossa história, algumas mais recentes e outras de outrora, que convenceram centenas, milhares e, por vezes, milhões de pessoas a cegamente seguirem suas maluquices e muito danosas ações.
O Rei James IV da Escócia trouxe o melhor da Renascença europeia para aquele país. Artistas, poetas, músicos, cientistas, diplomatas, dentre outros. John Damian era seu alquimista pessoal. Suas experiências públicas eram sempre apoiadas pelo seu ‘padrinho’.
A mais famosa foi sua tentativa de voo partindo das muralhas do Castelo de Stirling. Em setembro de 1507, Damian anunciou para a corte de James IV que voaria daquele Castelo até a França. Ele fez asas com penas e saltou...
Aleister Crowley, fruto de uma rica família britânica, nasceu em 1875 e faleceu em 1947. Era habilidoso em várias áreas, mas foi com a prática da magia negra que colecionou muitos seguidores e admiradores, dentre eles músicos e escritores famosos. Ian Fleming, o criador de James Bond, propôs que Crowley se infiltrasse em agências nazistas interessadas pelo ocultismo. E possivelmente o ‘V’ de Vitória de Churchill foi aconselhado por ele. Na prática, não passou de um charlatão, um playboy metido a bruxo que viveu à custa de quem acreditava nas suas bobagens. De bom mesmo foi só ter inspirado Ozzy Osbourne, Randy Rhoads e Bob Daisley a compor Mr. Crowley, uma das melhores músicas da carreira solo do ex-Sabbath.
Um dos gurus mais famosos do século XX foi o americano Jim Jones, líder do culto 'Templo dos Povos'. Começou suas atividades pseudo religiosas em Indiana, EUA. Curiosamente, visitou, nos anos 60, minha cidade natal, Belo Horizonte, e a colocou numa lista dos locais mais seguros caso houvesse uma guerra nuclear. Em 1965, mudou-se para a Califórnia, onde o fanatismo por ele cresceu de vez e, nos anos 70, foi para a selva da Guiana, no norte da América do Sul, com seus seguidores. O congressista americano Leo Ryan liderou uma delegação para investigar abusos de direitos humanos por parte de Jones. Em 1978, Ryan e outras 4 pessoas foram assassinadas por tiros em Georgetown, capital guianense, após deixar o local da comunidade. Ampliando em escala a tragédia, Jim, em seguida, ordenou então o suicídio / assassinato em massa de 918 dos seus membros em Jonestown, Guiana, muitos deles envenenados por cianeto. O maluco então suicidou com um tiro na cabeça.
Quando penso nos mitos de nossa história que fizeram e falaram muita besteira, eu me recordo, é claro, do argentino Ernesto “Che” Guevara. Uma foto marcante de Che, tirada pelo cubano Alberto Korda, em 1960, mostra o então guerrilheiro com traços fortes, dando a impressão de um homem com cara de homem. A foto vem rodando o mundo desde então, estampando camisas e bandeiras e ilustrando muitas capas de livros.
Guevara foi um aventureiro desorientado e um assassino profissional, mas também tinha outro lado, era médico e idealista. E, como as personalidades que hoje são consideradas mitos não passam de entidades com sérios problemas mentais, ignorantes em todos os assuntos e completamente abobalhadas, para ‘homenageá-las’ só posso me recordar da figura da Mula Sem Cabeça. Personagem do folclore brasileiro, a mula, que tem fogo no lugar da cabeça, galopa através dos campos desde o por do sol de quinta-feira até o nascer do sol de sexta-feira. Ou seja, algo sem sentido, sem pé, nem... cabeça.
A maior divindade criada no século XX foi, sem dúvida alguma, o líder cubano Fidel Castro. Mas, sua figura é tão complexa que um parágrafo seria pouco para falar do fanatismo internacional em relação a ele e da ditadura militar que criou.
Como o argentino Juan Domingo Perón é também um ótimo exemplo para falar sobre divindades, eu prefiro escrever um pouco sobre ele. Tirando Evita, musical e filme de sucesso, baseado na vida da primeira esposa de Perón, Eva, a Evita (‘Don’t cry for me Argentina...’, lembram?), o alcance de Juan como Deus não ultrapassou os limites da terra de Jorge Luis Borges, mas teve (e tem) um efeito semelhante à radioatividade na população daquele país. A briga maior entre os hermanos é para saber se ele foi um político de direita ou de esquerda. No final das contas, ele foi um populistas da pior espécie. Além das suas trapalhadas e excentricidades pessoais e namoro com o fascismo, conseguiu a façanha de quebrar financeiramente a Argentina. O país tinha uma economia sólida e um alto nível cultural antes de Perón. Ele fez tantas besteiras e desatinos em seus mandatos que até hoje os argentinos tentam, sem sucesso, se recuperar. Mas Perón continua Deus. Sim, com ‘D’ maiúsculo.
Para escrever sobre os justiceiros perigosos e danosos, pensei inicialmente no inglês Matthew Hopkins, um cruel caçador de bruxas do século XVII, que atuou durante a Guerra Civil Inglesa.
Mas, como queria fazer um paralelo com personalidades oficiais da época atual, eu me lembrei de Tomás de Torquemada, inquisidor-geral dos reinos de Castela e Aragão no século XV e confessor da rainha Isabel, a Católica. É conhecido por sua campanha contra os judeus e muçulmanos convertidos. Provavelmente o número de execuções durante o mandato de Torquemada foi de 2.200 pessoas. O chefe do ‘Escritório de Perseguições e Mortes Injustas’ da Igreja Católica naqueles reinos, segundo diria meu pai, depois que morreu certamente “caiu igual a uma pedra no inferno”. E o diabo ficou com medo dele.
Mas o que ocorreu com John Damian, o que tentou voar da Escócia até a França?
É claro que não voou nem um metro. Caiu no que os escoceses chamam de midden, tendo assim, felizmente para ele, uma queda suave. E sobreviveu.
Mas o que significa midden?
Quer dizer um depósito de lixo. No caso, este recebia todos os detritos provenientes do castelo de Stirling.
O grande problema é esse. O charlatanismo, os desatinos e as ações perigosas dos magos, gurus, mitos, semideuses e justiceiros, que vez ou outra surgem, são cegamente apoiados por uma massa de pessoas ignorantes. E este lixo é muito difícil de reciclar.
Parabéns! Novamente ótimo texto.
ResponderExcluirMuito obrigado, Alexandre! Abraço!
ExcluirMuito bom, Ernesto! Mais uma vez, um prazer ler o seu texto.
ResponderExcluirChel, Muito obrigado! Feliz em saber que gostou!
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