domingo, 10 de maio de 2020

O Que Sobraria de Você Para Mim e de Mim Para Você?


O relacionamento de entretenimento é um dos mais usuais na sociedade brasileira. É comum alguns estrangeiros não entenderem  porque é assim que funciona no Brasil. As pessoas não param, não pisam no freio hora nenhuma. São festas, restaurantes, casas de amigos, cinemas, bares, botecos, viagens, shows, eventos que se sucedem em um estresse interminável, gerando moléstias físicas e psicológicas nas pessoas.

Não que essas coisas sejam por si só ruins. Longe disso. Gosto de todas, mas pausas para olhar nos olhos dos seres que amamos são necessárias.

Bem, no ano de 2006 estávamos no meio da ‘Guerra ao Terror’, desencadeada pelos Estados Unidos após terem sido atacados pela organização fundamentalista islâmica al-Qaeda em 2001. Os EUA haviam invadido o Afeganistão, em 2001, e o Iraque, em 2003. Ambos ainda estavam ocupados pelas tropas americanas.

E, no dia 16 de dezembro daquele ano, na companhia de meu irmão, Alexandre, de meu amigo de várias jornadas musicais, Júlio, e de dois outros músicos, eu subi a um palco muitos anos após minha última apresentação.

Voltara à música por prescrição médica. ‘Você está estourando!’, me havia dito um amigo cardiologista em 2002. ‘Você não tem nada, só uma leve hipertensão. Mas, caso não retorne à música, vai adoecer de verdade!’

O sonho de tocar novamente, muito puro em meu coração, nada tinha (e continua não tendo) a ver com conquistar mulheres, usar drogas, beber até cair, passar noites em claro ou esquecer problemas do dia a dia. Eu simplesmente amava (e amo) tocar. E, portanto, seguindo orientação médica, comprei equipamentos complementares aos que eu já tinha e formei (com os músicos acima) uma banda semi amadora.

Na época do dito show de retorno, eu estava em um relacionamento ‘amoroso’ que ia de ruim a péssimo e me encontrava enfraquecido pela energia que ele demandava. Diria que eu estava ‘na capa’. Mas, na hora da apresentação, apertei o cinto da calça, subi ao palco e liguei os equipamentos. Era um show de rock e muito dependia de mim, pois fazia bases e solos, cantava algumas partes e, pela minha formação em música erudita, também era o principal responsável pela direção musical. Felizmente pensei comigo mesmo: ‘Cara, você está fazendo o que sabe e que ama! Confie em si mesmo!’.

Tudo deu certo na apresentação, o que gerou em mim uma energia a mais para tentar melhorar o tal relacionamento acima citado, o amoroso, se assim posso chamá-lo. O objetivo era evitar a outra opção, que seria buscar a porta de saída.

Bem, pouco tempo após o citado show, não sei bem quando, eu me revoltei (de forma educada, é claro) com a situação de excesso de entretenimento. No meio de uma agenda lotada que me foi apresentada atabalhoadamente, eu disse à minha então namorada: ‘Caso os Estados Unidos nos invadissem agora e tivéssemos que ficar confinados em casa, não mais haveria festas, restaurantes, casas de amigos, cinemas, bares, botecos, viagens, shows e eventos mil!’. E fiz a fatídica pergunta, tema desse texto: ‘O que sobraria de você para mim e de mim para você?’

Aprendi com a psicologia zen budista que devemos jogar luz nos problemas, como uma lanterna forte que afasta uma fera. A moça levou um susto. Não esperava por aquela. Ficou muda, pálida.

O relacionamento durou pouco mais que aquilo. E eu só a vi uma vez depois de encerrado. Ela me reconheceu. Eu, não. Não sobrara nada para mim. Eu havia dado meu amor, mas o desgaste sofrido fora avassalador.

Pois bem, 13 anos se passaram e aqui estamos nós, os moradores humanos desse planeta, já muito explorado, vivendo em cidades poluídas, encavalando diversões (pouco tempo atrás), consumindo de forma exagerada (ainda) e... diante de um confinamento forçado.

Pois bem, olhe para seu amor, seu amigo, sua amiga, seu irmão, sua irmã, enfim, as pessoas que são próximas a você, e pergunte baixinho, para si mesmo; ‘o que sobrou dele (a) para mim e de mim para ele (a)?’.

Pergunte antes (e depois também) que tudo volte ao normal, sempre longe do contexto do entretenimento.

E, o que eu gostaria de fazer após passar a pandemia, ou pelo menos após uma suavização dela?

Claro que voltar ao contato mais próximo com meu irmão e amigos, retomar as atividades profissionais presenciais e quando der, aos shows. Também, no tempo certo, porque não voltar às festas, casas de amigos, viagens, e aos cinemas, restaurantes, botecos, bares, shows e eventos. Tudo na medida certa não machuca.

Especialmente quero visitar um grande amigo, Duarte, em sua casa, para um encontro muitas vezes adiado, quando beberemos cerveja (eu quase não bebo, mas vou beber!), assistiremos a uns DVDs e vamos rir muito! Bobagens de brothers! A famosa Brodagem!

E sobre o coração de leão? Dizem que ele é puro. Faço o possível para que o meu seja. Tem a haver com a capacidade de dominar o ego, também forte em um leonino.

Escreveu Mário Quintana que ‘O Segredo é não correr atrás das borboletas... é cuidar do jardim para que elas venham até você.’

Estou fazendo o possível para cuidar do meu jardim. É um trabalho difícil, mas compensador. Com o tempo você conhece as folhas, as plantinhas e os insetos.

Gostaria de convidar a mais bela flor para visitar o meu jardim. Não sei se virá. Parte de mim tem coragem para acreditar que sim. Mas parte de mim não sabe sobre como essas coisas funcionam aqui, pois na outra dimensão tudo é mais simples. Há pessoas que já sofreram muito, pois um coração puro está sujeito a isso. É um risco que corremos.

Caso ela venha, vou pedir que me dê suas mãos e feche seus olhos. E eu lhe direi: ‘Prepare-se para nunca mais sofrer por amor!’

Um comentário:

  1. Fiquei muito emocionada com seu texto,você me fez chorar e refletir o que ja tenho visto há tempos .... essa futildade nos relacionamentos e esse " não olhar pro outro, que bom que pessoas como vc existem , em algum lugar exite uma borboleta e ela vai te achar ...beijos e muita Luz para você PS essE EMAIl é do meu filho , Assinado Dayse Seda

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